Por Verdade, Justiça e Reparação
Ato Sindical Unitário homenageia trabalhadores perseguidos na Ditadura
Noel Gomes nunca esqueceu os anos de perseguição que passou pelas fábricas que trabalhou. Primeiro na SOFUNGE, a Sociedade Técnica de Fundições Gerais, que operava no bairro da Lapa. O chefe da segurança da empresa era delegado do DOPS e amigo do temido Sérgio Paranhos Fleury, outro delegado conhecido por se valer de torturas durante os interrogatórios que comandava.
"Quando descobri isso fizemos boletins clandestinos e soltávamos na porta da fábrica. Mas infiltraram pessoas entre os operários para descobrir quem estava preparando aqueles boletins", conta Noel. Tempos depois o ex-operário foi demitido.
Dalí foi para a Cobrasma (Companhia Brasileira de Materiais Ferroviários), em Osasco. Em uma assembleia do sindicato, Noel fez uso da palavra e novamente foi demitido.
Após este capítulo entrou na Fundição Munck, em Cotia, onde, assim que começou a trabalhar, já recebera o aviso por meio de colegas: "você vai ser demitido antes de vencer sua experiência".
Ocorre que Noel estava com seus dados registrados nas famosas listas negras que as empresas criavam para marcar os trabalhadores que se integravam aos sindicatos, compunham greves ou apenas ousassem reivindicar seus direitos.
Como solução para evitar o desligamento ele se candidatou para a eleição de delegado sindical pela Oposição Sindical Metalúrgica de Osasco. Ganhou e, por conta disso, se manteve na empresa até a falência desta.
Ele recorda que meses antes de decretar falência a diretoria da empresa havia lhe chamado para uma reunião particular e oferecido uma alta quantia de dinheiro para que se mudasse e não atuasse mais no Movimento Sindical. Atitude que não se concretizou.
Desde então, até que conseguisse reaver na justiça os valores que lhe eram devidos após a falência da fábrica, foram mais de três anos desempregado, sobrevivendo de "pés de meia" que conseguia juntar em cada empresa que passara e auxiliado financeiramente por companheiros de luta.
Ele explica que só conseguiu outro emprego anos mais tarde na categoria dos comerciários de Osasco, onde permaneceu até se aposentar. "Mas o valor da minha aposentadoria a essa altura havia se tornado 1/3 do que eu recebia durante o tempo que me dediquei à categoria metalúrgica", lamenta.
Aos 63 anos de idade e mais de trinta de militância Noel esteve entre os trabalhadores homenageados neste sábado (01) no "Ato Sindical Unitário - Unidos, Jamais Vencidos", que aconteceu no Passo Municipal de São Bernardo do Campo.
Assim como Noel, outros personagens, como Jaime Rodrigues, Edson Albertão, Valdir Piantoni, Cícero Umbelino, Stanislaw Szermeta e Arcenio Rodrigues, que também fizeram parte deste triste e importante capítulo da história, foram lembrados.
A atividade organizada por dez entidades sindicais – entre elas a INTERSINIDICAL – recordou os crimes que a Ditadura cometeu, revelando ao público os primeiros resultados do GT de Trabalhadores de Comissão Nacional de Verdade (CNV).
Em vias de se completar 50 anos do Golpe Militar de 1964, o grupo já trouxe à tona nomes e histórias de mais de 590 trabalhadores que foram perseguidos, torturados, mortos ou que foram arbitrariamente presos nesse período.
Rosa Cardoso, Conselheira da Comissão Nacional da Verdade, afirmou que as investigações regidas pelo grupo de sindicalistas que atuam no âmbito da CNV estão levantando não somente o que aconteceu a partir de 1964, mas também o que aconteceu antes. "Houve cinco tentativas de golpe antes desse. Ele foi longamente ensaiado e foi, sim, civil e militar", afirmou.
A conselheira também defendeu que haja um processo de reparação a partir dos dados levantados pelo GT: "Temos de fazer uma operação especial como a Argentina e o Chile estão fazendo para buscar essa reparação das empresas. E nós faremos isso", enfatizou.
Bancários de Santos e Região
Representando a INTERSINIDCAL, Sergio Cabeça, dirigente do Sindicato dos Bancários de Santos e Região, destacou que ainda há muito que se conquistar. Ele também citou a famosa frase do educador pernambucano Paulo Freire: "É porque amo o mundo que luto para que a justiça social venha antes da caridade", completando: "nós não precisamos de caridade. Precisamos de trabalho, de enfrentamento e de luta".
A atividade também contou com dois belos esquetes. Produzido pela Companhia Teatral Solano Trindade em formato de musical os atores retrataram a imposição do Ato Institucional n° 5 e a luta dos trabalhadores pela conquista da democracia.
Já na segunda, o ator Tin Urbinatti apresentou um monologo colaborativo com participação da plateia em que refletia sobre o "Operário em Construção" – nome da peça em questão inspirada na poesia homônima de Vinícius de Mores – em uma sociedade de consumo e seu papel na busca de um mundo socialista e livre das amarras do capital.
Fonte Intersindical
Postado por Fernando Diegues em Notícias