A diretora Flavia Castro procura entender a vida e a morte de seu pai, militante esquerdista nos anos 1960
A sinopse do documentário “Diário de uma Busca”, longa de estreia de Flavia Castro, não anima: “Diário de viagem pelos países em que Celso A. Castro, pai da diretora, foi exilado e que foram os países da infância dela – Brasil, Chile, Argentina, Venezuela, França”. Antes da projeção na noite deste sábado (25) no cine Odeon Petrobras, a produção parecia uma grande egotrip. Mas a diretora consegue sair-se bem com um retrato complexo de um período conturbado na história latino-americana e mundial, além de uma busca cheia de becos sem saída para a morte prematura do pai.
Celso A. Castro era militante político na década de 1960. Já casado com a mãe da cineasta, Sandra, também militante, e pai de Flavia e de Joca, ele foge com a mulher do Brasil, depois de ser preso e torturado pelo Dops. Vão ao Chile, para onde os filhos são levados mais tarde, depois fazem treinamento de guerrilha na Argentina, tornam ao Chile, precisam escapar para a França. Com a anistia, o retorno ao Brasil parece, a Celso, uma volta dos derrotados. Deprime-se. E morre em circunstâncias suspeitíssimas após invadir o apartamento de um alemão, suspeito de ser um criminoso de guerra nazista, em situação descrita como suicídio pelos policiais.
A procura inclui viagem aos países onde ela morou e entrevistas com familiares, além das próprias memórias da diretora. A infância da garota é marcada pelas reuniões infindáveis, pela falta de pátria, pela ausência do pai. A jornada pessoal de Flavia é muitas vezes dolorosa até porque muito destemida e confrontadora de seu passado e de seus pais.
Por meio de sua busca, o espectador tem contato com um mundo cheio de ideais, que ela era pequena demais para entender quando viveu e que hoje pode nos parecer tão absurdo. É também a descoberta desse pai, uma figura difícil de decifrar, e, em grande medida, uma redescoberta de si mesma.
“Diário de uma Busca” podia passar sem algumas narrações excessivas da própria diretora e certamente se beneficiaria de uma duração um pouco menor. Mas toca e emociona com o reencontro com esse pai e com este país. O filme, premiado pela crítica como o melhor longa do último Festival de Gramado, foi recebido com aplausos.