A intolerância, em qualquer setor da vida, revela-se através de comportamentos agressivos, odiosos, tornando insuportável a vida em sociedade, atingindo muitas vezes contornos penais. Ao mesmo tempo, incita a violência, o desrespeito e estimula a perseguição aos diferentes.
No Brasil, a par da intolerância religiosa, nos últimos tempos tem se destacado um tipo de intolerância que atinge pessoas de orientação sexual diversa. Apesar dos discursos e do papel da mídia, encarando essas pessoas de forma natural, como deve sê-lo, o cotidiano revela outra face, dura e cruel. E, pior, fatal. No ponto mais caro, berço financeiro da capital paulista, verdadeiras hordas de criminosos extravasam seu ódio sobre aqueles que ousaram revelar-se por inteiro. Sem máscaras ou subterfúgios. Fora do armário, sendo que alguns lá jamais estiveram. Corajosamente, não se interiorizaram e não sufocaram seus desejos.
O balizamento do proibido e do permitido possibilitou aos intitulados diferentes a exposição, situação inimaginável pelos padrões de comportamento há alguma décadas. A vida sexual desenvolveu-se, evoluiu e a mudança de valores dominantes na vida social moderna exige respeito. Exige absoluta intolerância com o preconceito. Novas posturas tornam bizarros certos comportamentos que se mostram conflitantes com os padrões de conduta atuais.
E é nesse campo, especialmente da moral sexual, que se impõe reformulação no âmbito penal. Não faz sentido a condescendência com atos atentatórios à vida, simplesmente porque pessoas se orientam por outro viés entre quatro paredes.
O amor, mesmo aquele que não ousa dizer o nome, não contraria os bons costumes. O amor entre iguais - ou não - é simplesmente modalidade de comportamento para a realização de desejo íntimo que não pode ficar à mercê de julgamentos de estranhos à relação.
No Direito Penal, Welzel já ensinava que a ação não é típica, portanto não criminosa, quando corresponde à valoração considerada positiva pela comunidade, sendo socialmente aceita e realizada no âmbito permitido pela sociedade e pelos princípios éticos dominantes.
Além disso, conforme diz a canção popular, qualquer forma de amor vale a pena. Somente o ódio, a intolerância e o preconceito é que de nada valem. Necessário, portanto, empenho para que, sem mais delongas, seja criminalizada a homofobia, diante da catástrofe que se anuncia: a cada 36 horas, morre uma pessoa que ousou expressar sua orientação sexual.
texto: Claudionor Mendonça dos Santos (Promotor de Justiça e presidente do Movimento do Ministério Público Democrático)