Títulos sem valor vendidos no mercado serviam de garantia de dívidas do governo do Rio junto ao fundo
Transação não poderia ter sido feita; banco de Brasília que adquiriu os papéis podres abriu sindicância interna
As transações financeiras da corretora carioca Tetto realizadas após uma suposta pane no setor de informática da Caixa Econômica Federal ameaçam lesar em cerca de R$ 100 milhões o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), conforme aponta o banco em ação judicial.
A Folha revelou anteontem que a Tetto vendeu, como se não tivessem dívidas, papéis da dívida pública de baixo ou nenhum valor. O caso surge em meio a uma disputa entre PT e PMDB pelo controle da Caixa.
A Tetto só conseguiu fazer isso porque o sistema da Caixa que atestava a qualidade dos papéis, justamente sob uma vice-presidência do PMDB, ficou mais de dois anos inoperante.
Quando a informação voltou ao ar, os compradores tinham papéis que valiam ao todo R$ 1 bilhão a menos. E agora a União, que os garantia, pode ser acionada na Justiça para pagar a conta.
A Caixa reconheceu ter havido um "erro", que atribuiu a uma empresa terceirizada, mas alegou que a Tetto vendeu "gato por lebre".
No conjunto dos papéis vendidos pela Tetto também havia alguns que serviam de garantia para quitação de dívidas do governo do Rio de Janeiro junto ao FGTS.
Os papéis da garantia ao FGTS não tinham valor de mercado e não podiam ser comercializados.
Em e-mail interno, a Caixa diz que a dívida do governo do Rio com o FGTS era de R$ 70 milhões em 2003, o que representa um valor atualizado de R$ 100 milhões.
A Tetto adquiriu todos os contratos de crédito do Rio em 2005. Mas recebeu o documento com a informação de que um lote dos papéis não era comercializável.
Em março de 2009, durante o "apagão" da Caixa, a Tetto repassou créditos imobiliários ao banqueiro carioca Antonio José de Almeida Carneiro, do Fundo de Investimentos Aimorés, incluindo o lote vinculado ao FGTS.
A Folha apurou que o banqueiro pagou valores irrisórios à Tetto pelos ativos.
Em novembro de 2009, apenas oito meses depois da compra, Carneiro vendeu ao BRB, o banco do governo do Distrito Federal, por R$ 97 milhões, uma parte dos papéis adquiridos da Tetto, incluindo o lote do FGTS.
Quando o apagão da Caixa foi sanado, em 2011, o BRB descobriu que os papéis não valiam o que pagou e, pior ainda, estão como garantia de uma dívida.
Hoje os créditos estão em nome do BRB. E o FGTS poderá ficar sem o bem que garantia o pagamento da milionária dívida do Rio.
OUTRO LADO
O banco do Distrito Federal informou que está "buscando preservar os direitos do BRB frente a irregularidades que possam, eventualmente, ter sido cometidas".
Para isso, abriu uma sindicância interna para apurar o caso. A apuração começou neste ano, quando o governo passou às mãos de Agnelo Queiroz (PT). Na época das fraudes, o governador era José Roberto Arruda (DEM), que renunciou em 2010 após denúncias de corrupção.
Procurado, Carneiro não foi localizado. Em ofício à Caixa, ele se disse lesado pelo banco. A Tetto sustenta que sua operações são legais e responsabiliza a Caixa.