A ascensão de Marcial Portela coroa os erros em série do banco espanhol no Brasil, que trocou a "sustentabilidade" pelo lucro a qualquer preço
Dias atrás, o executivo Fabio Barbosa, até então presidente do Conselho de Administração do Santander, comentou com um amigo - a quem ajuda a traçar um plano de governo para a cidade de São Paulo - como estava o clima interno no banco Santander. - Não adianta encaminhar nada lá dentro, o ambiente está muito ruim.
Na condição de presidente do Conselho, Barbosa vinha tendo seu espaço minado pelo novo presidente, o espanhol Marcial Portela - e por isso começava a se dedicar a outras atividades, como a elaboração de um projeto político para São Paulo. Insatisfeito com a gestão de Portela, Fabio Barbosa buscou alternativas no mercado e está se recolocando como presidente-executivo do grupo Abril, que edita algumas das maiores revistas do Brasil, como Veja e Exame.
Com sua saída do Santander, o clima no banco é o pior possível.
Desconhecido no Brasil e com pouca habilidade política, Portela desembarcou com uma missão: aumentar os resultados e ampliar a transferência de lucros para a Espanha, que vive uma das maiores crises econômicas de sua história. Lá, por sinal, existe a ameaça de que o banco seja rebaixado pelas agências de classificação de risco - o que pode ocorrer também como o país ibérico. Para piorar, o controlador do banco, Emilio Botín, vem sendo investigado por fraudes fiscais e tributárias.
Marcial Portela, o presidente que substituiu Fábio Barbosa, é cria de Botín. E, curiosamente, chegou ao comando, no momento em que se discute uma multa de R$ 4 bilhões imposta pela Receita Federal ao banco espanhol, em função da contabilização do ágio na compra do Banespa - o Santander chegou a contratar os serviços da consultoria do ex-ministro Antonio Palocci, mas o problema não foi resolvido.
De certa maneira, a estratégia de gerar resultados a qualquer preço, implantada por Portela, rendeu frutos - ainda que de curto prazo. Os resultados gerados no Brasil já representam mais de 25% do ganho global do Santander no mundo. Mas a imagem do banco, sob a sua gestão, piorou muito. No dia 27 de julho deste ano, quando divulgou seu balanço semestral, o espanhol afirmou que os investidores teriam que ter paciência - e que, para quem não tivesse, o melhor seria investir em outra instituição. Só naquele dia, as ações do banco caíram 6%.
Desde que Portela assumiu o comando do banco, o desempenho das ações tem sido medíocre. No início do ano, as ações eram negociadas a quase R$ 22,00. No pregão desta terça-feira (23), fecharam a R$ 13,91. A queda em 12 meses é de 35,49% - duas vezes maior do que a do Ibovespa.
Erros em série
Esse estilo de gestão coroa uma série de erros do Santander no Brasil, que é o banco com o maior índice de reclamações de consumidores no Procon.
Fruto da aquisição de uma série de bancos, como o Noroeste, o Banespa e o Real, o Santander teve a chance de mudar sua imagem com Fábio Barbosa no comando.
Egresso do Real, Barbosa desenvolveu um discurso de responsabilidade social e sustentabilidade. Criou também uma campanha publicitária, com o mote "Vamos fazer juntos?", e patrocinou iniciativas importantes, como as ações do Afroreggae, uma ONG que previne a violência, no Rio de Janeiro.
O primeiro grande erro do banco espanhol no Brasil foi abandonar a marca "Real", que era apreciada pelos brasileiros, e substituí-la pela do Santander, que carrega os atributos negativos ligados à herança colonial ibérica.
Depois disso, o processo de integração tecnológica entre as agências do Real e do Santander foi um fiasco, tendo gerado inúmeras críticas de clientes.
Há dois anos, o banco também iludiu investidores no Brasil, ao fazer um IPO - um lançamento de ações - prometendo alocar os recursos no crescimento da operação no Brasil.
Hoje, sabe-se que o IPO foi feito no Brasil para aproveitar uma janela de oportunidade. Como havia muita liquidez financeira no Brasil, ao contrário do que ocorria na Europa, o IPO serviu apenas para captar recursos aqui e transferi-los à Espanha.
Fabio Barbosa estava descontente com a condução do banco. E, ao contrário do que dizem os comunicados formais do banco e da Abril, sua saída não foi fruto de uma escolha pessoal, mas dos erros em série cometidos pelo Santander no Brasil.